terça-feira, 23 de outubro de 2007

um outro tempo, um outro lugar

Chico Buarque teve muitos tempos difíceis no começo da carreira. Para quem não sabe ou mesmo pra quem quer relembrar, a história recente do nosso Brasil foi marcada pela ditadura militar, AI-5, torturas, nenhuma liberdade de expressão, torturas e mais torturas. Nesse cenário bem nebuloso e sombrio, o muso Chico Buarque, ainda rapazinho, recém-casado e com Marieta grávida da primeira filha, foi aconselhado pelo mestre Vinícius de Moraes a dar um tempo fora do Brasil, e foi o que fez em janeiro de 1969. Bem, essa história é relativamente conhecida. O mais doido disso tudo é que, já na Itália, Chico viu que o sonho de uma carreira internacional não seria tão fácil quanto ele pensara. Os shows foram ficando escassos e era preciso trabalhar. Desistir? Voltar pro Brasil? Não tão cedo. Foi então que ele se uniu ao amigo Garrincha, que também passava uma temporada lá. E na maior humildade do mundo...


Ele conta a história numa entrevista ao jornal Estado de S. Paulo:

(...) "Nós estávamos um pouco desamparados em Roma. Eu não estava trabalhando muito, estava vivendo um pouco de expectativa de voltar para o Brasil, e Garrincha estava lá fazendo alguns bicos como jogador, participava de algumas peladas porque ele gostava e ao mesmo tempo porque ele precisava, era um dinheirinho que entrava. Ele estava duro e eu também estava duro, então foi uma convivência muito especial, diferente de qualquer outra que possa ter. Ele era um sucesso formidável, íamos em lugares com arquibancadas improvisadas e tal, porque os jogadores não eram exatamente o Jordan e outros marcadores que teve, eram times amadores. Fazia umas três a quatro jogadas e saía aclamado de campo. Era impressionante a popularidade do Garrincha, lembra Chico, o motorista orgulhoso. A gente saía de carro e eu levava ele pra essas peladas. Era impressionante como, sete anos depois da Copa de 62, todo mundo ficava atrás: Garrincha! Garrincha! E eu era o chofer dele. (...) Eu via nele um sujeito muito sensível, a gente falava muito de música. Fiquei muito impressionado que Garrincha pudesse gostar de João Gilberto. E ele adorava João Gilberto. Nós falávamos de tudo, não era só de futebol. E falávamos tomando cerveja, tomando garapa. Ele bebia, e eu não posso falar nada porque eu bebia junto. Mas ele estava muito bem de espírito, nunca vi o Garrincha bêbado. Bebia bastante mas estava sempre alegre, não tinha aquela coisa depressiva do alcoolismo."


Sim, Chico foi o motorista do Garrincha. Não sei precisar por quanto tempo. Mas ele continuou compondo, claro. Foram seis discos neste período de 1968 a 1970. Só pra ter uma idéia, é dessa época "Ela desatinou", "Olê, Olá", "Apesar de você" e tantas outras. Esta última virou um dos hinos contra a opressão.

Podia até faltar luxo e fartura à mesa, mas inspiração, esta estava sempre com ele. Muso é muso mesmo, não tem jeito. Faz coisas belas até nos momentos mais críticos.

Filme: Um outro tempo, um outro lugar. Direção: Michael Radford. Grã-Bretanha, 1982.

3 comentários:

Mamãe de primeira viagem disse...

oi camila...
adorei esse texto...
não sabia que chico e garrincha tiveram essa amizade... que bacana... muito legal mesmo... o gênio da bola com o gênio da MPB... bela parceria...
beijos

Luciana Pessanha disse...

Bom saber mais sobre a trajetória desse mito Chico.
Beijo, Camilinha!

Anônimo disse...

oi camila
eu adooooooooro o chico...e adorei o texto...
sabia de deu motivo de ter saído no brasil e ido para roma...
eu fiz um texto sobre isso tbm na minha pag...rsrs

flw!