terça-feira, 27 de novembro de 2012

Resposta

Tentar deixar a pergunta dormir um pouco.
Pode ser a melhor maneira de abrir espaço para a resposta acordar.

Ana Jácomo



segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Procurado.... rs


"A verdade é que não há nada de tão cruel como um amor perfeito. Passamos vidas inteiras a arranjar suspeitos, a confrontar testemunhas. Toda a gente sabe que ele aconteceu, mas ninguém o viu. Ninguém sabe descrever-lhe o rosto. Ataca sobretudo em horas ou pessoas de plena distração, à revelia dessa confortável invenção humana a que chamamos razão."

Inês Pedrosa


domingo, 18 de novembro de 2012

ambiguidade e mutação

“Às vezes é preciso recolher-se. O coração não quer obedecer, mas alguma vez aquieta; a ansiedade tem pés ligeiros, mas alguma vez resolve sentar-se à beira dessas águas. Ficamos sem falar, sem pensar, sem agir. É um começo de sabedoria, e dói. Dói controlar o pensamento, dói abafar o sentimento, além de ser doloroso parece pobre, triste e sem sentido. Amar era tão infinitamente melhor; curtir quem hoje se ausenta era tão imensamente mais rico. Não queremos escutar essa lição da vida, amadurecer parece algo sombrio, definitivo e assustador. Mas às vezes aquietar-se e esperar que o amor do outro nos descubra nesta praia isolada é só o que nos resta. Entramos no casulo fabricado com tanta dificuldade, e ficamos quase sem sonhar. Quem nos vê nos julga alheados, quem já não nos escuta pensa que emudecemos para sempre, e a gente mesmo às vezes desconfia de que nunca mais será capaz de nada claro, alegre, feliz. Mas quem nos amou, se talvez nos amar ainda há de saber que se nossa essência é ambiguidade e mutação, este silêncio é tanto uma máscara quanto foram, quem sabe, um dia os seus acenos.”

Lya Luft

uma leve desordem na alma...


Bem assim: 

"Resumindo
digamos que oscilamos
entre alegria e tristeza
quase como dizer
entre o céu e a terra
ainda que o céu de agora e o de sempre
se ausente sem aviso
as ideias vão se tornando sólidas
sensações primárias
palavras ainda em rascunho
corações que batem como máquinas
serão nossos ou de outros?
este choro de inverno não é igual
ao suor do verão
a dor é um preço / não sabemos
o custo inalcançável da sabedoria
pensamos e pensamos duramente
e uma paixão estranha nos invade
cada vez mais tenaz
mas mais triste
resumindo
não somos o que fomos
nem menos do que fomos
temos uma desordem na alma
mas vale a pena sustentá-la
com as mãos / os olhos / a memória
tentemos pelo menos nos enganar
como se o bom amor
fosse a vida"

(Mario Benedetti)

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Construção


Quem não conhece o trabalho do poeta e escritor Fabricio Carpinejar, está em tempo. Abro esta crônica com uma citação extraída da ótima entrevista que ele deu para a revista Joyce Pascowitch: “O início da paixão é estratosférico, as pessoas não param quietas exibindo tudo que podem fazer. Depois passam a confessar o que realmente querem. A paixão é mentir tudo o que você não é. O amor é começar a dizer a verdade”.

É mais ou menos isso. No começo, a sedução é despudorada, inclui, não diria mentiras, mas um esforço de conquista, uma demonstração quase acrobática de entusiasmo, necessidade de estar sempre junto, de falarem-se várias vezes por dia, de transar dia sim, outro também. A paixão nos aparta da realidade, é um período em que criamos um universo paralelo, é uma festa a dois em que, lógico, há sustos, brigas, desacordos, mas tudo na tentativa de se preparar para algo muito maior. O amor.

É aí que a cobra fuma. A paixão é para todos, o amor é para poucos.

Paixão é estágio, amor é profissionalização. Paixão é para ser sentida; o amor, além de ser sentido, precisa ser pensado. Por isso tem menos prestígio que a paixão, pois parece burocrático, um sentimento adulto demais, e quem quer deixar de ser adolescente?

A paixão não dura, só o amor pode ser eterno. Claro que alguns casais conseguem atingir o sublime – amarem-se apaixonadamente a vida inteira, sem distinção das duas “eras” sentimentais. Mas, para a maioria, chega o momento em que o êxtase dá lugar a uma relação mais calma, menos tórrida, quando as fantasias são substituídas pela realidade: afinal, o que se construiu durante aquele frenesi do início? Uma estrutura sólida ou um castelo de areia?

Quando a paixão e o sexo perdem a intensidade é que aparecem os outros pilares que sustentam a história – caso eles existam. O que alicerça de fato um relacionamento são as afinidades (não podem ser raras), as visões de mundo (não podem ser radicalmente opostas), a cumplicidade (o entendimento tem que ser quase telepático), a parceria (dois solitários não formam um casal), a alegria do compartilhamento (um não pode ser o inferno do outro), a admiração mútua (críticas não podem ser mais frequentes que elogios), e principalmente, a amizade (sem boas conversas, não há futuro). Compatibilidade plena é delírio, não existe, mas o amor requer ao menos uns 65% de consistência, senão o castelo vem abaixo.

O grande desafio dos casais é quando começa a migração do namoro para algo mais perene, que não precisa ser oficializado ou ter a obrigação de durar para sempre, mas que já não se permite ser frágil. Claro que todos querem se apaixonar, não há momento da vida mais vibrante. Mas que as “mentirinhas” sedutoras lá do começo tenham a sorte de evoluir até se transformarem em verdades inabaláveis.

(Martha Medeiros)

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

A vida - fora os erros de revisão.

Achei bonito: 

"(...) O amor - fora do alcance da razão.
(...) A vida - fora o que não coube.
(...) O amor - fora de si.
(...) A vida - fora de ordem.
(...) O amor - do lado de fora
(...) O amor - fora o perigo duma recaída.
(...) A vida - for o que der e vier.
(...) O amor - fora o que passou despercebido.
(...) A vida - fora o que a gente esqueceu
A morte - fora de cogitação.
O amor - fora o que nunca se diz a ninguém.
(...) O amor - fora as noites passadas em claro.
(...) O amor - fora o trabalho que dá.
(...) A vida - fora os erros de revisão.
(...) A vida - fora certas crises de neurastenia.
(...) O amor - fora o que ela/ele não disse.
(...) A vida - fora o que vem nas entrelinhas.
O amor - fora o que se perdeu.
A vida - fora o tempo que se passa dormindo.
O amor - fora o tempo que se passa dormindo.
(...) A vida - fora os emolumentos.
O amor - fora algum reajuste posterior.
(...) O amor - nove foras nada.
(...) O amor - fora o que aconteceu antes."

(Paulo Mendes Campos in: O amor acaba - crônicas líricas e existenciais. Crônica: A vida, a morte, o amor, o dinheiro. Ed. Civilização Brasileira, p. 237-238)

Fonte: Blog Vem Cá Luísa

DESEJO


Queria ser essa noite que te envolve; e 
cobrir-te com o peso obscuro dos braços 
que não se vêem. Um murmúrio 
desceria de uma vegetação de palavras, 
enrolando-se nos teus cabelos como 
secretas folhas de hera num horizonte 
de pálpebras. Deixarias que te olhasse 
o fundo dos olhos, onde brilha
a imagem do amor. E sinto os teus dedos 
soltarem-se da sombra, pedindo
o silêncio que antecede a madrugada.

Nuno Júdice