quarta-feira, 29 de junho de 2011

uma caixa que se abre ao contrário

"Podias ter-me dito que ias sair da minha vida. A paixão é mesmo isto, nunca sabemos quando acaba ou se transforma em amor, e eu sabia que a tua paixão não iria resistir à erosão do tempo, ao frio dos dias, ao vazio da cama, ao silêncio da distância. Há um tempo para acreditar, um tempo para viver e um tempo para desistir, e nós tivemos muita sorte porque vivemos todos esses tempos no modo certo. Podias ter-me dito que querias conjugar o verbo desistir. Demorei muito tempo a aceitar que, às vezes, desistir é o mesmo que vencer, sem travar batalhas. Antigamente pensava que não, que quem desiste perde sempre, que a subtracção é a arma mais cobarde dos amantes, e o silêncio a forma mais injusta de deixar fenecer os sonhos. Mas a vida ensinou-me o contrário. Hoje sei que desistir é apenas um caminho possível, às vezes o único que os homens conhecem. Contigo aprendi que o amor é uma força misteriosa e divina. Sei que também aprendeste muito comigo, mais do que imaginas e do que agora consegues alcançar. Só o tempo te vai dar tudo o que de mim guardaste, esse tempo que é uma caixa que se abre ao contrário: de um lado estás tu, e do outro estou eu, a ver-te sem te poder tocar, a abraçar-te todas as noites antes de adormeceres e a cada manhã ao acordares. Não sei quando te voltarei a ver ou a ter notícias tuas, mas sabes uma coisa? Já não me importo, porque guardei-te no meu coração antes de partires. Numa noite perfeita entre tantas outras, liguei o meu coração ao teu com um fio invisível e troquei uma parte da tua alma com a minha, enquanto dormias."

(Fernando Alvim)

quinta-feira, 16 de junho de 2011

para o alto e avante, meu bem

"Eu quero mesmo é alguém me faça mudar completamente de opinião. Que faça meu corpo querer companhia nos momentos em que minha mente insiste pela solidão."


"Tô me aproximando de tudo que me faz completo,
me faz feliz e que me quer bem."


(Caio Fernando Abreu)

terça-feira, 7 de junho de 2011

espelho

Dentro da pele,
dentro da casa,
dentro do cosmo.

Entrar e sair de mim,
entrar e sair do mundo.

Eis-me prismática
em minha vida:

eu sou a casa,
eu sou a presa,
sou a janela.

Emissário de meu corpo,
saio e volto a minha cabeça,
a meu ventre,
a meu coração.

Entrar e sair de mim,
entrar e sair do mundo,
dançar o corpo entre
e refletir.

(Raiça Bonfim, que escreve lindo assim e lançará seu livro "10 pontes" no próximo dia 12/06 na Casa das Rosas, em SP)