sábado, 5 de maio de 2012

De-lembrares


E no telefone a sua voz chega ainda acordando, tanta manhã que faz. Falamos em projetos, presentes, viagens, tanta coisa. Depois disso, dormi sono demorado, daqueles que a gente pensa e lembra e quer, mas o danado do olho não fecha. A cabeça teima em futurar acontecimentos que ainda não aconteceram, sentimentos e falas, e já eu fico atordoada de vontades, trocando de travesseiros a todo tempo. Imagino casa sem parede, mundo sem distância, tempo sem calendário, e o sono me acorda: deixa de pensar besteira, menina. Tenho dessas coisas desde pequena, de querer andar pelas paredes e sentar no ventilador de teto – ainda nessa época a gravidade não tinha força nenhuma –, mas o doutor me olhava de rabo de olho. Mamãe não gosta de filha dela pensando pensamento mal pensado, mas agora não tenho mais, prometo, passou. Mas por que o sol e a lua não aparecem juntos? Por que não posso ficar acordada? Ah, essas coisas de-lembrar. Só que já faz noite funda e tenho medo de susto, então apago a luz e fecho os olhos bem fechados. Agora não penso mais, palavra minha que fico bem quieta. Quieta feito planta. Quieta feito cômoda. Quieta feito coisa que não barulha.


Alice Sant'Anna, que tem apenas (!!!) 20 e poucos anos e poetisa como poucos no blog pra não ficar na gaveta

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