terça-feira, 30 de setembro de 2008

febres loucas e breves que mancham o silêncio e o cais

Foi tudo lindo? Sim. Ainda que o calor beirasse o insuportável - e olha que eu sou fã de verão, mas afe, juro que me assustei com a quentura que é a terra onde o termômetro vai fácil até os 47°C. Eu vi o relógio da pracinha chegar aos 43°C na tarde de domingo. Pena não ter máquina na hora.

Mas então, se foi tudo ótimo, ainda que algumas intenções primeiras não tenham sido concretizadas, por que há dias que amanhecem cinza e todas as dúvidas - que estavam guardadas numa caixinha escondida no fundo de algum lugar - resolvem fugir e ficar dançando na sua frente? Por que, alguém sabe? É apenas para fazer graça, testar a nossa resistência ou provar algo que nem mesmo sabemos o que é?

Juro que não sei. Você também não. Espero que as dúvidas - traiçoeiras e sacanas que só elas - voltem e recolham-se à sua insignificância de antes. E que eu receba boas notícias em breve. Preciso delas - assim como preciso de você também.

Obs: O título do post vem da música Corsário, de João Bosco. Amo a música e esta frase em especial.

domingo, 21 de setembro de 2008

sobre desejos e necessidades

O desejo sempre se renova. Faz parte da essência do ser humano buscar por coisas ou pessoas - sem o desejo, não haveria ambição e nós morreríamos.

Agora que o coração aquietou, tenho sentido um desejo (ou será necessidade?) crescente de dar uma guinada na minha vida profissional. Que meu chefe não me leia, mas eu sei que minha trajetória lá nos confins da 7 de abril está chegando ao fim. Está tudo bem, mas sabe quando você está querendo mais? Que não te dá mais tesão acordar e pensar o que tem por fazer durante o dia? Ainda que eu goste um bocado do que faça, gosto mesmo, mas sei que neste caso é necessário mexer em time que está ganhando. E então eu me pego pensando - Ok, Camila, vc precisa sair de lá. Mas pra onde? Pra fazer o quê? Tenho uma séria dificuldade com escolhas - talvez porque durante longos e intermináveis anos escolheram por mim, e hoje, quando tenho que andar com as minhas próprias perninhas que Deus me deu, sinto uma enorme insegurança diante do leque de opções que me é oferecido. Gosto da idéia de trabalhar em uma revista, mas ao mesmo tempo me questiono como ficarei sem a rotina maluca e o contato diverso que tenho com pessoas trabalhando com eventos, por outro lado o salário pago em uma assessoria de imprensa me anima, mas aí me dá saudade dos eventos e uma certa nostalgia por nunca ter trabalhado em TV ou revista. Enfim, quero tudo, não decido nada e acabo não saindo do lugar.

Estamos trabalhando fortemente para mudar isso, mas ave Deus, como é difícil!!!

Para ilustrar o assunto e dar uma clareada nas idéias, trago um vídeo do Café Filosófico, programa da TV Cultura. O vídeo fala principalmente sobre o desejo afetivo e sexual pelo outro, mais ainda que não seja o objeto deste post, é um vídeo muito bom:

o que eu adoro em ti

A Revista Língua Portuguesa deste mês (09/2008) faz uma justíssima homenagem ao poeta Manuel Bandeira, em matéria de capa. Após 40 anos de sua morte, Manuel teve um livro de crônicas inéditas lançado em abril deste ano pela Cosac Naif. O site da editora traz um especial sobre a obra, coisa mais linda, veja aqui. E a revista me fez descobrir um poema lindíssimo de Bandeira, conhecido como o poeta da delicadeza e do erotismo velado. Apaixonadinha que estou, não pude deixar de me emocionar e de lembrar de alguém importante ao ler:

Madrigal melancólico

O que eu adoro em ti,
Não é a tua beleza.
A beleza, é em nós que ela existe.
A beleza é um conceito.
E a beleza é triste.
Não é triste em si.
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza.

O que eu adoro em ti,
Não é a tua inteligência.
Não é o teu espírito sutil,
Tão ágil, tão luminoso,
- Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem é a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas.

O que eu adoro em ti,
Não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento,
Graça aérea como o teu próprio pensamento,
Graça que perturba e que satisfaz.

O que eu adoro em ti,
Não é a mãe que já perdi,
Não é a irmã que já perdi,
E meu pai.

O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto maternal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.

O que eu adoro em ti – lastima-me e consola-me!
O que eu adoro em ti, é a vida.

Manuel Bandeira

terça-feira, 16 de setembro de 2008

e a vida segue, boa e incomensurável

Por tudo que há - que já é bastante, ainda que exista um mundo inteiro de emoções para ser vivido, sentido e, principalmente, compartilhado:

"(...) O prazer nascendo dói tanto no peito que se prefere sentir a habituada dor ao insólito prazer. A alegria verdadeira não tem explicação possível, não tem a possibilidade de ser compreendida - e se parece com o início de uma perdição irrecuperável. Esse fundir-se total é insuportavelmente bom - como se a morte fosse o nosso bem maior e final, só que não é a morte, é a vida incomensurável que chega a se parecer com a grandeza da morte. Deve-se deixar inundar pela alegria aos poucos - pois é a vida nascendo. E quem não tiver força, que antes cubra cada nervo com uma película protetora, com uma película de morte para poder tolerar a vida. Essa película pode consistir em qualquer ato formal protetor, em qualquer silêncio ou em várias palavras sem sentido. Pois o prazer não é de se brincar com ele. Ele é nós."

(Clarice Lispector)

sábado, 13 de setembro de 2008

nobres delicadezas

E então, nas visitas constantes e diárias que faço ao gmail, em busca de uma ou outra frase que faça o coração bater mais forte, eis que me deparo com uma mensagem de Claudia Roquette-Pinto, poeta com 5 livros de poesia publicados, além de participações em antologias nacionais e internacionais. Seu livro Corola ganhou o Prêmio Jabuti de Poesia em 2002.

Claudia, numa delicadeza que se vê muito raramente hoje em dia, me conta que viu um poema seu aqui mesmo no BCS e agradece pela citação. Ela comenta: "é sempre bom quando a gente percebe que tocou a sensibilidade de alguém, que a nossa poesia fez diferença. obrigada!" Diz ainda que o poema não estava completo (de fato, postei apenas um trecho) e oferece para enviar a outra parte, caso seja do meu interesse. E conclui: "de qualquer forma, saiba que gostei muito de ler o seu blog."

Como ficar indiferente diante disso, me diz? Algum ser com sangue correndo nas veias e coração batendo apressadamente no peito consegue? Eu amei, e fui logo em busca de mais.

Achei coisas belas como esta aqui:

fósforo

ela segue dormindo. na borda do lençol o que a acalenta não são flores - senão aquelas mínimas rosas, pontas buliçosas de falanges a afiar seus instrumentos. sobre as cinzas do peito vão as pegadas, fósforo expondo ao ar noturno seu poder de ignição. o objetivo: o ermo pavilhão (esquerdo) do ouvido. onde então dispersariam, indo pesar alhures. nas pálpebras lilases, nas pétalas pisadas dos olhos, onde outro grupo de homúnculos labora. com minúcia, com agulhas de prata eles picam a superfície da pele pálida e baça e tão logo abertas às intempéries da luz. a cada golpe da agulha ela sabe, a massa corrente dos sonhos, a água caiada quase a ponto de talho se enruga e ralenta, e onde ali havia superfície fluida, ininterrupta, o que se coagula?

semi-cerrada na madrugada avulsa ela espera que alguma mão (a sua?) trêmula recolha toda a alva matéria e a explique.

[Do livro: Zona de sombra, Cláudia Roquette-Pinto, Editora Sette Letras]

Por tudo isso e um pouco mais que eu amo este blog, que completa um aninho de existência este mês. Conheça mais da moça aqui.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

mulheres de 30

Eu vi. Gostei. Recomendo. Já falei sobre a peça aqui, mas agora tem o vídeo e o que é bom [quase sempre] vale a pena falar de novo.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

las miradas de tus ojos tan sutiles

"Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca."
(DOM Casmurro, Machado de Assis, cap. 32)

incontáveis palmas

E então eu disse que manteria um post mensal com diquinhas bacanas de novidades na área cultural... e vacilei logo no começo. Sorry. :-(

Um resumo breve do que aconteceu nos últimos 2 meses, culturalmente falando:

- Cinema:
Nome Próprio: E não é que é bom mesmo? Fotografia diferente, ótimo roteiro, Leandra Leal espetacular, eu e algumas pessoas queridas se identificaram bastante com a história da guria intensa que busca a todo custo respostas para suas angústias e seus vazios. Vi 2 vezes. Recomendo.
- O Escafandro e a Borboleta: Filme triste é muito bom, principalmente quando é bem feito. Não recomendado para depressivos e suicidas.

Teatro:
- O Dom do Ciúme: Melhor que a apresentação (ótima), só a Márcia Tíburi toda bravinha pq tinha gente na platéia animada demais com a performance do marido dela (que estava cantando, no palco). Machadão que me desculpe, mas desta vez ele ficou em segundo plano. ;-)
- A Alma Imoral: Muito apropriado para o momento atual, versa sobre transição e mudança, tradição e modernidade, o que é bom e o que é certo. Muito bom, Clarice Niskier dá um show sozinha, sem cenário e com um único pano preto que ela utiliza para fazer vários vestidos (boa parte da peça ela fica sem ele, inclusive).
- Ópera Ariadne em Naxos: Já vi encenações mais interessantes. Achei essa um pouco confusa demais, mas do meio para o final ela engrena e vira uma bela história de amor.

Exposição:
- Bossa na Oca: Amo bossa nova e amei a exposição, as músicas, a praia artificial, as imagens de arquivo, os vídeos, tudo.
- Machado de Assis - Mas este capítulo não é sério. Fundamental para qualquer pessoa que goste de literatura. Sen-sa-ci-o-nal.

Música:
- Além dos óbvios Chico, Marisa, Vercilo, Baleiro e Bethânia, tenho escutado Vinícius de Moraes (muito e incansavelmente), João Bosco, Danni Carlos (a fase internacional), Celso Fonseca, Adriana Calcanhotto (o novo cd dela, Maré, é uma graça), Teresa Salgueiro, Cat Power, Nouvelle Vague, Mônica Salmaso, Trash pour 4. Têm me ajudado nas minhas buscas o last.fm e o eMule. Passatempo bom esse de buscar coisa boa pra ouvir, gostar e baixar. Delícia. :)

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

creio...

CREIO NOS ANJOS QUE ANDAM PELO MUNDO

Creio nos anjos que andam pelo mundo,
Creio na Deusa com olhos de diamantes,
Creio em amores lunares com piano ao fundo,
Creio nas lendas, nas fadas, nos atlantes,

Creio num engenho que falta mais fecundo
De harmonizar as partes dissonantes,
Creio que tudo eterno num segundo,
Creio num céu futuro que houve dantes,

Creio nos deuses de um astral mais puro,
Na flor humilde que se encosta ao muro,
Creio na carne que enfeitiça o além,

Creio no incrível, nas coisas assombrosas,
Na ocupação do mundo pelas rosas,
Creio que o Amor tem asas de ouro. Ámen.

Natália Correia